3.5.11

Como uma das nossas atividades, pedimos aos nossos alunos que levantassem hipóteses sobre como seria uma possível continuação do conto "Passeio Noturno" (Rubem Fonseca). Para nossa surpresa, o resultado foi muito mais do que o esperado, a criatividade estava "à flor da pele". Uma das produções mais criativas foi a do aluno Adysson. Leia e se surpreenda:

                          Um possível "Passeio Noturno II"

Um novo dia entediante teimava em começar. Levantei já calçando o chinelo com estofado na parte de baixo, desgastado até. Fui à cozinha. A copeira tinha posto o café na mesa. Minha mulher assistia o primeiro telejornal daquela manhã. Aqueles cujo nome te dá bom dia, mas que lhe bombardeiam de notícias que farão o dia começar com uma penumbra de horrores na coluna policial. Minha filha estava no quarto lendo o seu novo livro destinado a garotas e seus relacionamentos conturbados. Meu filho... Não sei. E também me era indiferente.
Sentei à mesa solitária, tomei uma xícara de café. Estava muito forte para o meu paladar. Peguei o jornal que estava sobre a mesa só para ver se havia algo nele que me interessasse. Nada. Embora me distraia por instantes com as tirinhas do Garfield e também aqueles... Os vikings e que eu nunca lembro o nome, mas que me dá uma sensação de fazer parte dela. Aprontei-me, peguei a pasta entupida de papéis e saí para a companhia.
Como num ciclo que nunca parece cassar; cheguei em casa. Joguei as pinhas de papéis na biblioteca, procurei a mulher pela casa, mas não a encontrei. Apenas achei a copeira. Ela tomava o meu uísque como se fosse dela e eu também nem me importei com isso. “A patroa e os meninos foram à casa da avó, é aniversário da coroa” disse ela entre um gole e outro. O que me estranhava era alguém ainda se importar com aquela vela gorda e rabugenta e que ficava mais velha mais gorda e mais rabugenta.
Estava praticamente só em casa. Isso me empolgou por um momento, mas logo vi que não tinha o que fazer naquela casa. Fui até garagem, peguei o carro, abri as portas automáticas da garagem saí com o carro e fechei as portas só num toque de um botão. Dei um primeiro arranque. Fui quase a 80 Km/h só na euforia da primeira macha. Sentia-me seguro só de respirar o ar do interior do veículo e segurar firme no volante. Mas algo parecia diferente nele. Não liguei. Mas já ia a mais de 130Km/h. Do nada avistei um muro no meio do caminho que sempre passara ali por diversas vezes e nunca notei. Mas tudo bem apesar da velocidade, os freios eram projetados perfeitamente para aquele carro grande e pesado. Enfiei o pé no freio com todo o peso do meu corpo. Nada detinha aquele carro de ir contra o muro. Senti o coração quase explodir de tanta adrenalina. Pela primeira vez naquele possante automóvel, tremi o mais pavoroso medo que poderia sentir. A barriga mais parecia a casa de um esquimó de tão fria. Os olhos e narinas abriram como nunca antes, tentei engolir o nó preso na garganta. Eu já nem mais pertencia a mera física newtoniana. Num golpe de esperteza, puxei o freio de mão com força, mas já era tarde de mais. Choquei-me contra o muro. O barulho do impacto era como dinamites explodindo. Os air bags não acionaram. Voei contra o para-brisa que ia espalhando os estilhaços por todos os lados e deslizei pelo capô já com a testa ensanguentada. Mal consegui senti a dor do meu corpo, quando subitamente vi uma luz de farol que me ofuscava na rua transversal àquela. E que vinha em minha direção. Levantei com todo o esforço e o carro parecia querer fazer patê de mim. Corri ainda que todo desengonçado, o carro não era de luxo, mas podia fazer certo estrago. Dobrei a esquina daquela rua fria e escura, me escondi atrás de uma árvore. E simplesmente esperei para me recuperar. Já nem lembrava mais do meu carro agora com a frente arrasada. Após um tempo olhei para os lados, vi que tudo estava tranquilo. Saí vagarosamente pelo meio fio da rua até que notei o capô do mesmo carro bem atrás de mim. Agora sentia dez vezes mais medo do que a instantes atrás. Então o veículo acelerou e em frações de segundo depois senti o capô fazer o meu corpo dar um salto mortal que nenhum ginasta fizera igual. Caí de barriga sobre o asfalto. Ergui a cabeça e avistei o para-lama correr no carro assassino pela rua desértica. Tudo me parecia estranho demais para apenas um acaso desde muro muito suspeito até agora. Tive de ir para casa mancando e sangrando. Era um caminho relativamente curto, mas naquelas condições faziam ser três vezes mais longe.
Cheguei a casa minha mulher havia chegado estava assistindo televisão. E olhou pra mim e disse “Você está com um ar cansado, coma um pedaço de bolo que troxemos de mamãe e vá dormir amanhã você terá um dia terrível na companhia”. E eu disse: “Qual sabor?” 




Adysson Ferreira da Silva, 15 anos de idade. Atualmente está no 2º ano do Ensino Médio.

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